Sunday, January 03, 2010

A sinuca e os abraços




Foi depois de mais uma tarde no clube, onde eu e ele matávamos nossas saudades de infância jogando sinuca e bebendo cerveja. Com montanhas ao redor, como todo o resto da cidade, era no centro de um tablado em construção que ficava a mesa do jogo e nossos últimos momentos juntos. Só era a mesa, sob um chão de britas, e duas cadeiras velhas de madeira que nos bastavam.

Um pouco longe das piscinas, ao lado do campo de futebol, eu um pouco perdida falei: “Eu não sei jogar muito bem”. E então, como sempre o Jonas respondia, com as mãos no bolso do calção jeans e aquela voz ainda de guri: “Ah, vamos jogar só pra passar o tempo”. A gente começava cedo, às 13h30, por aí.... Ao chegar, passávamos na copa e pedíamos para a Preta (que não é preta, é a mulher do Volmar) um picolé napolitano, uma cerveja e umas cinco fichas para a sinuca. Eu e o Jonas passamos as tardes lá, e nesse tempo, sempre aparecia alguém: amigos de infância, minha irmã Su e meu primo Wagner, que são primos irmãos do Jonas também. Foi o lugar onde todo mundo se reencontrou para beber uma “breja”.

Foi na semana entre o Natal e o Ano Novo, eu ia ficar lá na minha cidade natal até o dia 26 de dezembro e só o Jonas sabia me fazer companhia. Todos dizem a mesma coisa, às vezes me pergunto como é que uma pessoa só conseguia ser companhia para todos ao mesmo tempo. Mesmo ele morando em São Francisco do Sul, eu em Porto Alegre, a Su e o Wag em David Canabarro e o Junior e a Rafa em Joenville.

Os amigos já não eram mais os mesmos pra mim, tudo lá no interior agora é diferente. As pessoas crescem, mudam as gerações, mas parece que tudo é igual. Tomar chimarrão na praça, na frente da igreja ou atravessar a rua da casa dos meus pais, onde tem o Bar do Ico, que é o eterno e único “point” da cidade. Ir para lá se tornava sempre melhor se o Jonas estivesse por perto. No dia 26 eu viajei para o Norte, antes disso, a gente nem esperava se encontrar.

Ele sempre me deixava ganhar, dizia que eu era muito boa jogadora e não deixava de contar uma piada se um de nós errássemos a mira por causa da bebedeira. Foi então que o vento ficou forte, e parecíamos os únicos sentindo aquilo no meio de tantas árvores e plantações da cidade pequena. Jonas largou o taco sobre a mesa, levantou seu braço enorme até o meu ombro e disse, com um olhar emocionado “muito massa esses dias que eu tô passando aqui. Eu sabia que tinha que vir pra David antes do Ano Novo, ainda bem que liberaram uns dias lá no trabalho”. Eu respondi que parecia coincidência, porque só pude ir de última hora porque era a estagiária mais nova do meu trabalho, não ia ganhar tantas folgas para viajar assim.

No outro dia era Natal, almoço com a família ao ar livre e lá estávamos nós no clube de novo. Foi a nossa última jogada juntos. Teve janta e missa a noite, e eu e o Jonas cumprindo o ritual natalino. Depois daqueles dias que me parecem até nostálgicos, chegou a hora da despedida. É claro que nenhum dos dois imaginava que seria nosso último abraço para o resto da vida. Foram três longos apertos. Um disse para o outro o quanto a gente se amava e eu não parava de agradecer pelas tardes de sinuca e outros programas para quebrar o tédio do interior. No terceiro e último abraço, ele já estava quase indo embora e eu falei “Nossa, não consigo te deixar ir embora, já me bateu uma saudade enorme. Te amo como meu irmão mais novo, Jonica. Se cuida, tá?”. Ele deu aquela risada com os dentes serrados e com voz de criança respondeu “Eu também te amo como irmã, Monezinha. Se cuida também” e saiu caminhando com o Wag. Eu fiquei cuidando os dois, com um aperto enorme no peito. Parece que alguém estava nos olhando e dizendo: esse é o abraço da última vez. E foi.

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